O Banco Central é autônomo, mas precisa se explicar

O Banco Central é autônomo, mas precisa se explicar

Por Roberto Macedo*

Prefiro chamar o Banco Central (BC) de autônomo em relação ao governo federal porque o termo independente me parece muito forte para caracterizar seu status. Ele integra o governo e é sustentado por este, mas tem autonomia administrativa. Tanto tem que o governo Lula não pôde substituir seus diretores neste início de mandato.

Há um órgão que faz o “meio de campo” entre o BC e o governo, o Conselho Monetário Nacional (CMN), composto pelo ministro da Fazenda (seu presidente), o ministro do Planejamento e o presidente do Banco Central. O CMN não tem funções executivas e lhe cabe apenas estabelecer as diretrizes gerais da moeda e do crédito a serem adotadas no País.

A fixação das metas de inflação a serem perseguidas pelo BC é um dos assuntos mais importantes do momento, com muita discussão sobre se o CMN deve aumentar essas metas no momento, mas seus três membros só têm conversado sobre o assunto. Não sei se o presidente do órgão, o ministro Fernando Haddad, teria poder de decidir pelo aumento das metas caso o presidente do BC fosse contra a mudança e a ministra Simone Tebet fosse a favor. Acho que não caberia aumentar a meta por enquanto porque isto geraria expectativas de que o governo estaria relaxando seu controle da inflação, o que levaria ao próprio agravamento dela, pois os agentes econômicos que determinam preços passariam a uma atitude defensiva, pressionando-os para cima na suposição de que a inflação passaria a subir.

Entendo que o presidente do BC, Roberto Campos Neto, deveria ser chamado pelo Congresso a explicar uma questão importante, o fato de que hoje a taxa Selic está muito acima da taxa de inflação.

De abril a agosto de 2020 o IPCA, que é o índice de preços perseguido pelo BC, ficou em torno de 2% em 12 meses, mas veio a guerra na Ucrânia, que aumentou o preço do petróleo e das commodities, entre outros efeitos inflacionários, e a partir daí a inflação foi subindo até chegar a 12,1% em doze meses, em abril de 2022, mas em seguida começou a cair e terminou o ano passado em 5,8%. Ao mesmo tempo, o BC foi aumentando a Selic, que também estava em 2% ao ano em meados de 2020, até chegar em 11,75% em abril de 2022; e continuou aumentando-a até chegar a 13,75% em agosto de 2022, ficando nessa taxa até hoje.

As questões que o presidente do BC deveria responder seriam estas: por que o BC não segurou a Selic logo que a inflação passou a cair? E por que a diferença entre as duas taxas é tão alta, com os últimos dados mostrando a Selic em 13,75% ao ano e a inflação de janeiro de 2023 sendo 5,8% em 12 meses?

A título de provocação, também perguntaria por que nos Estados Unidos, mesmo com o seu BC aumentando a taxa básica de juros, ela está abaixo da inflação? Em números, essa taxa de juros passou ao intervalo de 4,5 a 4,75% ao ano recentemente, com o BC reduzindo o aumento anterior de 0,5% para 0,25% ao ano, enquanto a inflação de janeiro deste ano foi de 6,25% em 12 meses.

Voltarei ao assunto neste espaço se o presidente do nosso BC responder essas questões em algum pronunciamento.

* Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.

Artigo publicado no site do Espaço Democrático em 27 de fevereiro de 2023.

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