PIB do terceiro trimestre pode vir com recessão

Há uma previsão de taxa positiva e outra, de taxa negativa, ambas de valor absoluto próximo de 0,11835

Por Roberto Macedo*

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgará no início de dezembro a variação do produto interno bruto (PIB) no terceiro trimestre deste ano. No primeiro, foi de 1,2%, relativamente ao trimestre anterior, uma ótima taxa trimestral. Mas ficou por aí, e no segundo teve até pequena queda, de 0,1%. As perspectivas para o terceiro trimestre, examinadas mais à frente, são péssimas. Pode vir até outra taxa negativa, o que levaria o PIB a uma “recessão técnica”, marcada por dois trimestres consecutivos de queda. Se vier, será rasa em sua profundidade, mas incomodará, pois será mais um sinal de que a economia brasileira vai mal.

Passando à política econômica do governo Bolsonaro, ela é marcada pelo desgoverno. Desde o início, o presidente só pensa naquilo, ou seja, em ganhar a eleição de 2022. Despreza a questão fiscal, agora com a compra de votos no atacado, ao oferecer R$ 400,00 mensais de Auxílio Brasil para angariar apoio principalmente no Nordeste, onde sua rejeição é maior e Lula atrai a maioria. Mas Lula, também com pouco apego à questão fiscal, na sua campanha poderá prometer R$ 600,00, em lugar dos R$ 400,00 de Bolsonaro, e dizer, ainda, que estes só valerão até dezembro de 2022, e sua proposta seria de algo permanente.

Na economia também há forte inflação, no que a própria política governamental tem parte da culpa, porque a questão fiscal foi agravada com a PEC dos Precatórios, com o maior teto de gastos e com a insistência da Câmara dos Deputados nas chamadas emendas do relator, que acabaram tendo um assim-não-dá do Supremo Tribunal Federal. Mas o governo vai insistir, e tudo isso gera incertezas na economia, refletindo-se na taxa cambial, que aumenta e gera mais inflação, o que, por sua vez, leva a aumentos de juros pelo Banco Central, desestimula consumidores de bens e serviços e desencoraja empresários a fazer investimentos em formação bruta de capital fixo (mais infraestrutura, fábricas, fazendas e outros investimentos), que poderiam expandir o PIB e gerar mais empregos.

Empresários se orientam pela perspectiva de lucros e por um cenário que garanta a realização deles, e este é prejudicado pelas incertezas que vêm do lado fiscal. A certeza é de que o governo não tem compromisso com esse lado.

No detalhe, o terceiro trimestre foi de entressafra agrícola, com o que o PIB do setor agropecuário deve mostrar taxa negativa. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre-FGV), em fase de divulgação, espera-se que a indústria como um todo não tenha crescimento, caindo a produção da indústria extrativa, a da indústria de transformação e a de eletricidade – quedas aliviadas pelo bom desempenho da construção civil. Ainda que com queda do comércio, mas impulsionado pelos transportes e por outros serviços, espera-se um crescimento do setor de serviços. Com essas e outras informações, o Ibre-FGV prevê crescimento de apenas 0,1% no terceiro trimestre. Quase nada.

Na terça-feira passada, vieram números de uma segunda fonte de dados trimestrais, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), que procura prever as variações do PIB. A previsão para o terceiro trimestre foi de uma queda à taxa de 0,14%, que, se confirmada pelo IBGE neste ou noutro valor negativo, marcaria o início de mais uma recessão técnica, conforme já explicado acima. Entre as duas previsões citadas, prefiro ver confirmada a taxa negativa do IBC-Br. A diferença entre as duas é pequena, mas a notícia de uma nova recessão acentuaria mais o mau estado da economia, que talvez assim recebesse atenção maior do governo e da sociedade.

Até agora, o PIB não voltou ao seu valor de 2014 (!), nem deve voltar no final deste ano. Aliás, é enganosa, no que se refere à realidade atual, a taxa esperada para o PIB segundo o mais recente boletim Focus, do Banco Central (BC) – um aumento de 4,9% em 2021, relativamente ao PIB de 2020. Enganosa porque a parte mais importante dela, de 3,6%, ocorreria mesmo que o PIB tivesse crescimento nulo dentro de 2021, pois o cálculo é feito relativamente ao buraco que teve em 2020, quando caiu 4,1% e fez uma recuperação em V até o fim do ano. Mas, olhando apenas o crescimento dentro de 2021, a taxa esperada é de apenas 1,3%, que, somada à citada parcela de 3,6%, levaria aos 4,9%.

Vem aí a época de festas, mas, no caso do PIB, só haverá o que lamentar. E Bolsonaro? Certamente, comemorará as 400 pratas que distribuirá por meio de sua nova versão do Bolsa Família, esperando que seja reverenciado por quem teve a sorte de levar o dinheiro. E o presidente também quer um inoportuno reajuste salarial para o funcionalismo público federal.

Quanto ao Brasil e seu PIB, o legado que Bolsonaro vai deixar já pode ser previsto, e é lamentável. As taxas do PIB durante o seu mandato devem ficar em 1,2% (2019), -4,1% (2020), 4,9% (2021) e 0,9% (2022), as duas últimas conforme previsões do mais recente boletim Focus. A média aritmética delas ficaria em 0,73%, uma das mais baixas da história dos mandatos presidenciais brasileiros.

*  Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.

Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 18 de novembro de 2021.