Agilidade organizacional no setor público

 Por Roberto Macedo

Nossos governantes em geral não têm pressa, e muitos problemas de interesse público têm sua solução procrastinada. Alguns exemplos vieram às manchetes nos últimos dias, como o de que tomou décadas a negociação entre o governo paulistano e o federal quanto ao que fazer com o Campo de Marte; e na cidade a cracolândia continua de pé. Há anos ouço falar da privatização da Eletrobras, mas o assunto continua empacado e foi, também, desvirtuado com emendas do Congresso. E as reformas administrativa e tributária não escaparam à lentidão do setor público.

Alguns problemas, se fossem objeto de melhor e mais rápida agilidade organizacional do setor público, teriam impacto positivo na produção e na produtividade da economia, colaborando para o seu maior crescimento. Vejo esse crescimento como prioritário em termos de políticas públicas, em face da estagnação da economia desde a década de 1980, no sentido de um crescimento econômico abaixo do seu potencial.

Mas nossos políticos, salvo exceções cada vez mais excepcionais, têm suas prioridades aéticas, pois não visam ao bem comum e são rápidos só no encaminhamento de assuntos de interesse pessoal ou de grupos. No momento, a prioridade é a reeleição dos incumbentes de mandatos, no Congresso recorrendo, inclusive, às indecentes emendas parlamentares do relator do Orçamento, assunto que ganhou enormes proporções, mas felizmente vem recebendo grande atenção da imprensa, que desvendou o chamado “orçamento secreto”, o que levou a uma decisão do Supremo Tribunal Federal pró-transparência.

Neste contexto, foi com satisfação que vi o assunto de que trata o título deste artigo sendo objeto de texto da consultoria internacional McKinsey, que costuma abordar assuntos de interesse público nos seus estudos. Não tenho espaço para uma visão completa do texto, mas a quem quiser acessá-lo sugiro procurá-lo no Google pelo seu título: Better and faster: Organizational agility for the public sector.

O texto, que também faz referência a outros estudos da McKinsey, destaca os seguintes aspectos (tradução livre): 1) metodologias ágeis podem transformar a maneira como um governo planeja, opera e entrega seus produtos e serviços; 2) como cada nível de uma organização governamental tem diferentes papéis e prioridades, os mais eficazes princípios básicos da agilidade serão também diferentes; 3) os resultados poderão ser maior produtividade e melhores serviços para os cidadãos; 4) metodologias do setor privado podem ajudar no desempenho e na saúde organizacional; 5) pesquisa da McKinsey mostrou que 70% de organizações ágeis ficam no quartil superior de saúde organizacional; 6) características podem tornar entidades governamentais dificilmente adaptáveis a um modelo ágil, como o mais longo horizonte dos seus orçamentos, usualmente anuais, e a competição interna por volume fixo de recursos, que pode desencorajar a colaboração dentro do governo – como os retornos dos investimentos são frequentemente dispersos dentro dele e publicamente, pode ser difícil de motivar funcionários a trabalharem para melhoria que não necessariamente veem ou experimentam; 7) esses aspectos recomendam a adoção de princípios ágeis, como o de trabalhar com objetivos e resultados com avaliações trimestrais; 8) a estrutura hierárquica – com sua cultura e seus modos de trabalhar – também pode tornar difícil a implementação de metodologias ágeis, como organizações menos hierarquizadas e interações rápidas.

Prosseguindo: 9) uma abrangente implementação ágil é uma enorme tarefa, que requer sólidos compromissos de poder, recursos e um foco de ponta a ponta no interesse de quem terá os benefícios; 10) a perspectiva de esforço tão significante poderá desencorajar muitos líderes governamentais de assumirem compromissos, com o que essas transformações requerem líderes visionários.

Concluindo o resumo: 11) o texto volta a enfatizar dois princípios de agilidade, o de trabalhar na direção de objetivos e resultados com avaliações trimestrais; 12) também propõe a colaboração entre diferentes setores do governo, pois vários trabalham de forma isolada, e não em ações comuns entre eles, e dá como exemplo uma colaboração entre líderes em áreas como saúde, educação e trânsito em apoio a cidadãs grávidas. Noutro exemplo, uma agência de transporte público interessada em aumentar a clientela criou um time envolvendo especialistas em planejamento de transportes, engenharia de dados, operações, serviço ao consumidor e marketing.

Como dito anteriormente, a agilidade organizacional do setor público requer muito esforço e líderes visionários. Ora, tais líderes são muito escassos no Brasil, com a maioria dos políticos mais voltada para seus próprios interesses e de grupos. Por isso venho insistindo, neste espaço, em que a sociedade brasileira precisa se organizar para cobrar dos políticos medidas voltadas para o bem comum. Incluirei essa agilidade entre os pilares de plano que já apresentei neste espaço enfatizando essa cobrança.

Roberto Macedo é economista (UFMG, USP e Harvard), professor sênior da USP e membro do Instituto Fernand Braudel.

Artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 19 de maio de 2022.

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